15 - Michelly

Cadeira: 15
Patrono: 
Primeiro ocupante:
Segundo ocupante:
Terceiro ocupante:
Quarto ocupante:



AS BARATAS




Tenho uma estranhíssima conexão com baratas: Para mim, elas são mensageiras da morte. A primeira vez que me lembre foi em 1994. Estava indo para a escola quando um desses seres cascudos voa diretamente para o meu ombro. Uma semana depois recebo uma notícia que muito me abalaria: Uma grande amiga havia falecido de eclâmpsia na África do Sul onde era missionária da igreja, e isso ocorrera sete dias atrás, justamemte no dia do pouso da barata. Foi a primeira vez que não consegui almoçar na vida. Depois sempre tive vários "avisos" trazidos por esse inseto tão desprezível. Em 2021 estive à beira da morte e quando minha irmã encostada a mim foi lavar minha roupa do cesto disse que vários desses seres estavam embolados nas peças, possivelmente anunciando minha futura morte, pois justamente nesse dia fui entubada e colocada em coma induzido, mas o Senhor Deus que é o dono de toda criatura não permitiu que minha vida fosse ceifada. Vários avisos se concretizaram trazidos pelo tal artrópode e quarta-feira agora viajei de madrugada. Qual minha surpresa quando vejo uma barata vindo pra cima de mim, como se estivesse me encarando. Pensei logo que logo viriam más notícias. Tentei matá-la, mas ela se escondeu. Quando fui colocar a mala no carro minha desagradável mensageira estava em cima dela. Minha irmã olhou-me em silêncio e eu prossegui em minha viagem. Hoje é sábado e recebo a notícia do falecimento do irmão mais novo de minha mãe. Infelizmente, mais uma vez, a mensageira da morte dera o seu fúnebre recado.    MIBAAS - 27.05.23


O algodão e a seringa

Você já percebeu que algumas coisas parecem sumir e do nada aparecem  naquele mesmo lugar que você já havia procurado ou simplesmente parecem mudar de lugar? Isso acontece muito com óculos, chaves e controles remotos, e com meias, nem se fala! 
O que pouca gente sabe é que no mundo dos objetos inanimados há um encanto quando não há humanos por perto e nessas horas eles podem se locomover e expor suas opiniões, já dizia nosso ilustríssimo Machado de Assis. Esse relato a seguir foi uma amiga enfermeira que me contou quando apareceu de surpresa para tomar mais uma xícara de café e ouviu o diálogo acalorado entre as partes.
No ambulatório do posto de saúde havia uma rixa antiga que a tempos era conhecida entre os instrumentos cirúrgicos que havia entre o pacote de algodão e a seringa. Quando todos os funcionários iam embora no turno da noite começavam os debates que eram esperados pelos expectadores que mostravam suas preferências através de gritos de incentivo ou de palmas.
Invariavelmente o algodão tentava mostrar sua superioridade em relação à seringa que quase nunca se mostrava afetada por aquela empáfia, mas naquela noite ele resolveu provocar de forma mais irritante a seringa que era seu desafeto, e por pouco não foram às vias de fato. Quem de longe visse aquele pacote tão fofinho de algodão não imaginaria quanto rudeza havia naquele ser:
 - Sou tirado das lavouras, apanhado diretamente da natureza, conhecido e utilizado desde os primórdios da humanidade quando começaram a fiar para fazerem roupas. Sou biodegradável, logo sou absorvido pelo ambiente, não poluo a natureza levando centenas de anos para desaparecer. Não infecto aquela pessoa desavisada que é picada por uma agulha contaminada. Eu sou conhecido pelo princípio da limpeza. Sou eu que higienizo a pele, seja para retirar os resquícios da maquiagem ou para preparar para o recebimento do medicamento. 
Os partidários do algodão sempre o cumprimentavam por tamanha oratória, mas os que torciam pela seringa já estavam acostumados com aquela calma fleumática e sabiam que ela observava tudo para contra-atacar no final. E o algodão continuava seu discurso:
- A nossa amiga seringa só causa dor por onde passa. Quantas pessoas tem aiquimofobia, um medo excessivo de agulhas? Tem gente que até desmaia! Há drogas injetáveis que são utilizadas através dela, meus senhores! Há quem utilize de seringa para obterem resultados mais rápidos através de esteroides, mas nós sabemos que isto faz muito mal para a saúde, não é mesmo?
Afiada como sempre, sem mexer um músculo sequer, a seringa que até então estava deitada, ergue-se e responde calmamente:
- Data venia. O amigo algodão argumentou sobre muitos aspectos que em parte são verdadeiros, mas gostaria de dizer que o douto colega esquece-se de alguns fatores. É verdade que não sou um objeto natural, que sou invenção humana, mas desde quando diremos que algo seja bom ou ruim se consideramos apenas a sua origem? 
Ouve-se um burburinho entre as partes da plateia, alguns de aprovação e outros de negação, e a seringa continua afiada:
- Se há pessoas que tem medo de mim ou que me utilizam de maneira escusa, não tenho culpa nisso. Vejam minha prima faca: Com ela você passa manteiga no pão. Ela tem culpa se alguém a utiliza para tirar a vida de uma pessoa? Não! Não há culpa no instrumento, mas sim é o sujeito que escolhe a utilidade que queira dar a ele! Pergunte ao diabético que faz uso de insulina se o mesmo não precisa de mim para viver! E às pessoas com urgência de medicamentos injetáveis?!
A conversa se estende até de manhã quando o posto de saúde reabre suas portas para atendimento ao público e logo uma técnica retira um chumaço de algodão do pacote, encharca-o com álcool e aplica uma injeção em um paciente que parecia não ter tomado banho a se dizer o estado que ficara o algodão até então imaculado. Após utilizar os objetos descarta-os na caixa de produtos hospitalares e segue em seus afazeres, e lá no escuro da embalagem, a seringa ainda fala para o algodão:
- Estás vendo meu amigo? A vida é muito breve. Num instante estamos discutindo e no outro já estamos trabalhando em conjunto. Agora pergunto: Para quê tanto orgulho se no fim vamos para o mesmo lugar, terminamos na mesma caixinha, não importa quem você é ou ache quem seja?
O algodão que agora estava sujo e usado não disse nada, mas pelo fungado que deu pareceu concordar com a colega. 
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MIBAAS
Fortaleza
03.03.23

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Oração Acadêmica


Grandioso Deus, eterno pai, aqui estamos reunidos em tua presença para te agradecer pelo dom da vida, pelo amor das pessoas que nos são caras, e te pedimos humildemente Senhor, que afaste de nós todo o mal, pela tua divina proteção.

Te pedimos sabedoria Senhor, para que possamos conviver com nossas famílias, colegas e amigos em espírito de fraternidade, que saibamos acolher quem precisa de uma palavra de conforto, e que possamos estender a mão amiga quando se fizer necessário.

Não nos deixe ensoberbecer, Senhor. Que permaneçamos serenos diante dos elogios e das críticas. Que a sinceridade seja o alvo de nossas vidas, mas que não machuquemos a ninguém com palavras de desamor.

Tudo isso te pedimos em clemente oração, entregando em tuas mãos a essência de nossas vidas. Amém.

 

Acadêmica Michelly Barros

22.10.22




PANDEMIA

             Em tempos de isolamento social respeitei ao máximo as normas do governo propagadas pelos canais de comunicação: ficar em casa (fiquei um mês sem pôr os pés na calçada) saindo apenas em casos essenciais, usar máscara ao entrar nos estabelecimentos, manter distância nas filas, higienizar sempre as mãos, não visitar ninguém, e por aí vai.

            Mesmo em casa acredito ter desenvolvido uma forma leve da virose: Tosse, falta de paladar e de olfato foram os sintomas apresentados. De acordo com alguns estudos científicos há indicação que o tipo sanguíneo O (o tipo de sangue de meus pais e dos cinco filhos) seja o que possui menor grau de complicações, e realmente acredito nisso já que minha irmã fez teste e comprovou que tivera o tal vírus que veio da China e só precisou tomar os medicamentos passados diante dos primeiros sintomas, graças a Deus.

            Não vou negar: Já fui três vezes ao shopping. Poderia ter esperado um pouco mais? Talvez, mas alguns assuntos pendentes exigiam minha presença naquele oásis de compras. Vi com tristeza lojas sem clientes, vendedores com olhares perdidos, lugares vazios onde antes havia quiosques sempre tão movimentados. Fico imaginando quantos empregos foram perdidos e me pergunto o que essa multidão de desempregados irá fazer para sobreviver.

Por exigência de uma das redes de ensino onde trabalho, para resguardar minha saúde (sim, sou doce, tenho diabetes), tive que ir ao médico para conseguir laudo que atestasse essa minha inclusão no grupo de risco da COVID – 19, mas não sei ainda se as comorbidades serão levadas em consideração na volta às aulas presenciais.

Enquanto eu aguardava minha vez de ser atendida notei que havia cadeiras marcadas com um X em vermelho, alertando que aquelas não deveriam ser utilizadas, obviamente. Pois não é que uma criatura chega tossindo, com máscara no queixo e senta-se bem ao meu lado? Incrédula, viro-me cortesmente para ela e digo:

- Senhora, essa cadeira não pode ser ocupada. Tem-se que manter distância. Por isso a cadeira está marcada com um X.

Ela olha para mim com cara de deboche e não responde nada, mas percebo o ar de desdém em seu rosto. Levo em consideração que ela é mais velha do que eu e tento argumentar.

Repito a advertência verbal, mas sem efeito. Olho para ela mais atentamente e percebo que ali há uma inegável ignorância, explícita em suas ações, e irredutível, sem se abalar, a miserável permanece lá sentada, balançando a perna cruzada.

Meu cérebro reptiliano, aquele de dimensões primitivas, me impulsiona e avalio o que aconteceria se em um rompante eu a puxasse pelo braço ou pelos cabelos e a tirasse de perto de mim, ensinando-lhe bons modos...

Mas para a sorte de todos era segunda-feira de manhã: Não queria estragar minha semana com um fato de pequena importância, apesar de ter me zangado. Respirei profundamente. A sensatez prevalece e afasto-me indo sentar-me em outro assento. Considerei e não coloquei minhas mãos naquela ridícula, afinal não havia levado meu álcool em gel.

A cena é observada por alguns outros pacientes que ficam abismados com a ignorância daquele ser ignóbil. Uma senhora que se indignara com o episódio olha para mim me apoiando e fala em som audível: “ É por isso que o vírus se espalha. O pessoal não quer obedecer regras! É bem feito que o governador feche tudo de novo!”

A outra, sentindo-se citada, responde:

- Eu já tive essa doença. Quanto mais medo a pessoa tiver  aí é que se pega mesmo. – Diz ela, querendo se justificar. E mesmo que já tenha sido acometida pelo vírus, ninguém garante que ela esteja realmente imune ou que não possa ser transmissora da doença.

Ela olha para mim, me observa, percebo através de minha visão periférica. Fico só refletindo: Da virose a senhora pode ter ficado curada, mas da ignorância, duvido.

 

***

 

MIBAAS – 01.08.20

 

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